Trabalho e Energia Cinética

O que é energia?

No nosso cotidiano, empregamos a palavra “energia” em diferentes situações e conseguimos passar o seu significado. Como exemplos, dizemos que “uma pessoa está cansada e sem energia”, que depois da tempestade “a casa ficou sem energia”, que  a usina de Angra dos Reis é  “alimentada por energia nuclear”, etc. No entanto, o termo “energia” utilizado nas experiências que temos do nosso dia – a – dia não possui a mesma definição e rigor da “energia” como grandeza física.

Na Física, como outros conceitos básicos, a energia não é algo fácil de se definir. Em aulas de Física, aprendemos o que é energia através de exemplos,  como a energia cinética, potencial, mecânica, eletromagnéticas, etc.

O que sabemos também é que diferentes formas de energia estão relacionadas entre si, no sentido de que uma forma de energia pode se transformar em outra – como a energia elétrica que se transforma em calor -, mas com uma condição muito importante: a soma de todos os tipos de energia num sistema fechado permanece constante, ou seja, a energia é conservada.

A conservação da energia é um princípio fundamental na Física.

Trabalho

Antes de definirmos precisamente o conceito de energia, vamos definir o conceito de trabalho na Física. Da mesma forma que energia, a palavra “trabalho” é de uso comum no cotidiano. Dizemos que fulano “realiza trabalho”, tem coisas que dá “bastante trabalho” para se fazer, “exercícios para trabalhar” determinados músculos do corpo, etc.

Na Física, o trabalho é definido como sendo a transferência de energia por meio de uma ou mais forças que atuam sobre um corpo. Como consequência, esse corpo sofre um deslocamento \Delta \vec{r}.

Num caso mais simples, as forças aplicadas ao corpo são constantes, como a força gravitacional agindo sobre o corpo próximo da superfície terrestre. Num caso mais complexo, que analisaremos também, é o trabalho da força gravitacional variável,  quando não nos limitamos a movimentos próximos da superfície da Terra, como no caso do movimento de um foguete.

É importante observar que, independentemente do tipo de forças envolvidas, o trabalho contabiliza a quantidade energia transferida, sem levar em conta o tempo de atuação do trabalho (a duração da força ou conjunto de forças).

Trabalho realizado por uma força constante

Conforme já mencionado acima, para que haja trabalho, uma força (ou conjunto de forças) deve atuar sobre um corpo e o ponto em que a força é aplicada deve se deslocar.

A figura abaixo mostra um rapaz empurrando um carrinho. Se a força \vec{F} aplicada pelo rapaz provocar um deslocamento \Delta \vec s no carrinho, na mesma direção de \vec{F}, então dizemos que essa força realizou trabalho.

Neste exemplo específico, em que \vec{F} é constante e paralela à direção do movimento do carrinho, o  trabalho é dado por

    \[W = F \Delta s \]

Ainda considerando \vec{F} constante, podemos ter uma situação um pouco mais geral. No caso, a \vec{F} pode fazer um ângulo \theta em relação à direção de deslocamente. Neste caso, somente a camponente da força ao longo do movimento contribui para o trabalho. Logo, temos que

    \[ W = F \Delta s \cos \theta \]

O trabalho realizado por  uma força sobre um objeto é igual ao produto do módulo da força pelo deslocamento sofrido pelo objeto na direção da força.

 

  • Nenhum trabalho é realizado a menos que o objeto se mova.
  • O trabalho depende do ângulo \theta entre a força e deslocamento. F \cos\theta é a componente da força na direção do deslocamente \Delta s.
  • O trabalho pode ter valor positivo ou negativo dependendo do ângulo \theta entre a força e deslocamento (lembre-se que \cos\theta <0 para 90^\circ < \theta \leq 180^\circ).

Podemos representar o trabalho através do gráfico da força ao longo da direção do movimento versus deslocamente, (F \cos\theta) \times \Delta s.

Para simplificar, vamos assumir que \theta=0 e que \Delta s = s_2-s_1. Neste caso,

    \[ W = F (s_2-s_1) \]

Como F é constante, obtemos o gráfico abaixo:

 

Podemos verificar facilmente que o trabalho é numericamente igual à área do retângulo azul. Lembrando que a área do retângulo é base vezes a altura, onde a base está representada pelo deslocamento (\Delta s = s_2-s_1) e a altura pela força, a partir da abscissa (eixo horizontal), temos que

    \[ \textrm{\'Area } = \textrm{base} \times \textrm{altura} = F \Delta s \]

Logo, a área é numericamente igual ao trabalho.

Trabalho realizado por uma força variável

Existem situações em que uma força aplicada (ou várias)  num corpo não é constante, ou seja, enquanto ela agir, o seu módulo, direção ou sentido podem variar.

A força de compressão ou elongação elástica da mola é um bom exemplo. De acordo com a lei de Hooke, F = -kx, onde x é quanto a mola foi comprimida ou esticada. Neste caso, não é possível utilizar a expressão W= F \Delta s \cos\theta.

No entanto, podemos fazer uso desta expressão para se obter a expressão correta para o trabalho de uma força variável. No caso, vamos analisar situações em que somente a magnitude da força varia.

A figura abaixo mostra o gráfico de uma força (de módulo variável aplicada a um corpo) em função do deslocamento s do corpo. A curva em vermelho mostra que F varia com s.

Para o cálculo do trabalho total, vamos dividir a área abaixo do gráfico e acima do eixo horizontal, entre as posições s_1 e s_2, em pequenos retângulos, cujas larguras  \Delta s são  variações de posições muito pequenas.

Se o deslocamento \Delta s for infinitesimal  (nomenclatura para um tamanho muito pequeno, tendendo a zero), podemos considerar que durante esse deslocamento a força  tem módulo praticamente constante. Quanto menor for \Delta s, melhor será essa aproximação. Se isso ocorrer, a área de largura \Delta s abaixo da curva em vermelho e a área retangular de mesma largura (em branco), com a altura sendo a força constante, serão praticamente a mesma.

Para calcular o trabalho total, que corresponde numericamente à área do gráfico abaixo da em vermelho,  basta fazermos a soma das áreas de todos os retângulos. Temos portanto que

    \[ W\approx \sum_{i=1}^N F_i \Delta s_i \]

onde somamos a área do i-ésimo retângulo de altura F_i e largura \Delta s_i. Há N desses pequenos retângulos.

O sinal \approx indica que o trabalho é aproximadamente igual a soma. Matematicamente, não é igual. A igualdade é válida somente quando aplicamos o conceito de limite do Cálculo diferencial e integral, um importante ramo da matemática.

http://ecalculo.if.usp.br/

Se a largura \Delta s_i de cada faixa tender a zero (matematicamente, representada por \Delta s \to 0), o número de faixas tornar-se infinitamente grande e  a somatória se torna igual à área embaixo da curva. Temos portanto que,

    \[ W= \lim_{\Delta s \to 0} \sum_{i=1}^N F_i \Delta s_i \]

No jargão do cálculo, este limite é a integral definida  da função F(s)  entre os limites s_1 e s_2 e é representado por

    \[ W= \int_{s_1}^{s_2} F(s) ds \]

No gráfico força \textcolor{azul}{F}} versus deslocamento \textcolor{blue}{s}, o trabalho realizado pela força (de módulo constante ou variável) entre as posições \textcolor{azul}{s_1}  e \textcolor{azul}{s_2} é numericamente igual à área formada entre a curva da função \textcolor{azul}{F(s)} e o eixo horizontal \textcolor{azul}{s}, de \textcolor{azul}{s_1} até \textcolor{azul}{s_2}.

Trabalho de uma força variável: exemplo

Conforme mencionamos acima, a força exercida por uma mola sobre um objeto depende do grau de distensão ou compressão, representado por x.

De acordo com  a Lei de Hooke,

    \[ F = -kx \]

onde k, a chamada constante de mola, representa a rigidez da mola quanto à deformação.

Tomando a expressão em módulo, isto é, |F| = kx, obtemos o gráfico abaixo.

Conforme discutido, o trabalho realizado por essa força sobre um corpo é numericamente igual a área abaixo da curva (no caso, uma reta), até a abscissa, entre as posições x_1 e x_2. Para x_1=0 e x_2=x qualquer, a área a ser calculada é a de um triângulo retângulo. Neste caso específico, não precisamos utilizar conceitos de cálculo para calcular o trabalho.

Temos que

    \[ W= \frac{\textrm{base} \times \textrm{altura}}{2} = \frac{(kx)\times x}{2} \quad \Rightarrow \quad \boxed{\tau = \frac{1}{2} k x^2} \]

Teorema Trabalho – Energia Cinética

O teorema trabalho – energia cinética é um importante teorema da Física, que conforme veremos adiante, diz que o trabalho de uma força resultante (soma de todas as forças envolvidas no cálculo do trabalho) produz variação da energia cinética de um corpo.

Antes de enunciar e demonstrar o teorema, vamos explicar o que   é a energia cinética de um corpo.

Energia Cinética

Conforme discutido na seção “O que é Energia?”, na Física há diferentes formas de manifestação de energia. A energia cinética, K, de um corpo está relacionada com a sua velocidade v e depende da massa m do corpo. Conforme o teorema trabalho – energia cinética, essa grandeza é definida como

    \[ K = \frac{1}{2}m v^2 \]

O Teorema Trabalho-energia cinética

Enunciado:

O trabalho realizado pela força resultante que atua sobre um corpo é igual a variação da energia cinética do corpo.

Demonstração do teorema – caso particular com força constante

Para o caso em que a força resultante atuando sobre um corpo é constante, é relativamente fácil demonstrar o teorema trabalho energia cinética.

De acordo com a segunda lei de Newton para um corpo de massa m,

    \[ F_r = m a \]

Assim, o trabalho da força F_r constante será dado por

    \[ W_r = m a \Delta s \]

Por outro lado, como F_r é constante, temos que a aceleração a será constante (assumindo que a massa permaneça constante), ou seja, estamos tratando do movimento retilíneo uniformemente variável (MRUV). Vamos lembrar que para este tipo de movimento, a equação de Torricelli é válida:

    \[ v^2 = v_0^2 + 2 a (s-s_0) \]

Para o caso  em que a situação inicial é rotulada com índice “i” e a final por  índice “f“, temos que

    \[ \frac{v_f^2 - v_i^2}{2} = a (s_f-s_i) = a \Delta s \]

Se multiplicarmos toda a equação por m, o lado direito dá W:

    \[ \frac{v_f^2 - v_i^2}{2} m = m a \Delta s =W_r \]

Demonstração do teorema – força variável

A situação mais geral possível é quando o corpo percorre uma trajetória em 3D sob ação de uma força resultante na direção qualquer, cujo módulo, direção e sentido podem variar ao longo do caminho.

A demonstração a seguir será o caso unidimensional, onde a partícula  está se movendo ao longo do eixo x, sob ação de uma força resultante também nessa direção.

A demonstração envolve conceitos de cálculo diferencial e integral, sendo portanto além do escopo para um estudando do Ensino Básico. Para os corajosos e curiosos, clique no link para visualizar a demonstração:

 

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